sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

A solteirona

A Solteirona (Paris, outubro de 1836) - primeira história de "As Rivalidades"

Personagens: Susana, Cavaleiro de Valois, senhora Lardot, senhor Du Bousquier, senhora Granson, Atanásio Granson, senhorita Courmon (Rosa-Maria-Vitória), padre Sponde, Jacquelin, Josette, Marieta, senhor de Troisville, senhorita Armanda d'Esgrignon. 

A história se passa entre 1816 e 1830. 

Balzac, que odiava solteirões, veja-se Pierrete e o Cura de Tours, apresenta aqui uma amável solteirona, embora dê a ela um destino infeliz. 
A Solteirona conta a história da disputa de dois homens pela mão da senhorita Rosa-Maria-Vitória Courmon, o melhor partido de Alençon, embora já estivesse na faixa dos quarenta anos. De um lado, representando a monarquia, estava o Cavaleiro de Valois, um remanescente do Ancien Régime; “Sua pele, já tão branca, parecia mais branca ainda pelo uso de algum preparado secreto. Sem usar perfumes, o cavaleiro exalava como que um aroma de mocidade que refrescava o ambiente. Suas mãos de fidalgo, cuidadas como as de uma dama, atraíam o olhar pelas unhas cor-de-rosa e bem aparadas”. Dou outro lado, representando a república estava o grosseiro senhor Du Bousquier, melhor caracterizado pela sua moradia: “A lareira de pedra mal pintada contrastava com um formoso relógio, desonrado pela vizinhança de uma par de castiçais ordinários. A escada, por onde todos subiam sem limpar os sapatos, nunca tinha levado uma só mão de tinta. As portas, finalmente, mal pintadas por um operário da região, espantavam o olhar com suas tonalidades berrantes. Essa casa era igual à época simbolizada por du Bousquier - oferecia um amontoado confuso de porcarias e coisas magníficas”. Du Bousquier fizera fortuna como fornecedor de víveres para o exército revolucionário, mas caíra em desgraça com Napoleão. Aguardava em Alençon uma oportunidade para refazer seu patrimônio.  
Rosa-Maria-Vitória não casara na época da Revolução, pois desejava desposar um fidalgo e temia o tribunal revolucionário. Entre 1804 e 1815, eram escassos os bons partidos em função da guerra. Assim, chegou aos quarenta anos tendo que se contentar com um noivo “indígena”. 
A história começa com uma manobra do Cavaleiro de Valois para obter a senhorita. Ele convenceu a bela engomadeira Susana, que desejava ir para Paris, a dizer que estava grávida de Du Bousquier. Assim, Susana conseguiu dinheiro do republicano para a viagem, e, além disso, procurou a Sociedade Maternal, que apoiava jovens solteiras grávidas, que era presidida pela senhorita Courmon. Assim, a solteirona ficaria com a impressão de que Du Bousquier era um libertino. "
Em parte o plano deu certo. Ocorre que o padre Sponde, tio de Rosa, recebeu uma carta de do senhor de Troisville, militar, neto de um amigo, que desejava se estabelecer em Alençon. A solteirona julgou que era seu marido que chegava. Mandou arrumar a casa, reformar os quartos, organizar a melhor prataria e servir as melhores bebidas para esperar o visitante. Na recepção oferecida a ele, diante de toda a sociedade da província, Rosa ficou sabendo que Trosville era casado há dezesseis anos e tinha quatro filhos. Humilhada, ela decidiu casar com o primeiro solteiro que aparecesse. E foi Du Bousquier. “Enfim, a República impotente derrotara a valente Aristocracia, em em plena Restauração.” 
Nesse meio tempo, o jovem Atanásio Granson, secretamente apaixonado pela senhorita Courmon suicidou-se  afogando-se no rio. 
Du Bousquier, passando a administrar a fortuna da esposa, prosperou finaceiramente. Também inclinou a casa Courmon para o partido liberal: “A casa Courmon, sob a hábil influência de Du Bousquier, constituía essa opinião fatal que, sem ser verdadeiramente liberal nem resolutamente monarquista, gerou os 221 no dia em que se definiu a luta entre o mais augusto, o maior, o único poder verdadeiro, a Realeza, e o mais falso, o mais inconstante, o mais opressivo dos poderes, o poder chamado parlamentar, exercido pelas assembleias eletivas”. 
O cavaleiro de Valois, tendo perdido a contenda, declinou fisicamente ”Enfim, as ruínas tão sabiamente reprimidas fenderam esse belo edifício e provaram o quanto é grande o poder da alma sobre o corpo: pois que o homem louro, o cavaleiro, o jovem herói morreu quando a esperança falhou”. 
O cavaleiro faleceu em 1830, quando Du Bousquier já era Recebedor geral. E a senhora Du Bousquier, aos sessenta anos, revelou a uma amiga que não suportava a ideia de morrer donzela, confirmando o que Balzac insinuara diversas vezes: que Du Bousquier, assim como o regime que ele representava, era impotente.
A descrição da casa da solteirona é tão vívida, que provavelmente corresponde a algum lugar real que Balzac conheceu.  É muito interessante a ideia de fazer tipos representaram ideias políticas. E fazer da disputa de uma mulher uma alegoria da disputa pelo poder político. 
A Solteirona não é o melhor de Balzac, mas tem tudo de melhor de Balzac.