Personagens: senhora Vauquer, senhora Couture, Victorina Taillefer, senhorita Michonneau, pai Goriot, Vautrin (Jacques Collin), cozinheira Sílvia, Eugênio de Rastignac, criado Cristóvão, senhor Poitet, Horácio Bianchon, Conde de Restaud, Anastácia (condessa de Restaud, née Goriot), conde Máximo de Trailles (amante de Anastácia), senhora de Beauséant, Marquês d´Ajuda Pinto, senhorita de Rochefilde, Delfina (baronesa de Nuncigen, née Goriot), barão de Nuncigen, senhor de Marsay (ex-amante de Delfina).
A história se passa entre novembro de 1819 e 21 de fevereiro de 1820.
A abertura de O Pai Goriot é a típica descrição balzaquina. Estamos na pensão Vauquer, um verdadeiro laboratório do mundo, lócus onde se cruzam os que desceram e os que irão subir. Na hora da refeição, em novembro de 1819, se reunem os três personagens que conduzirão a história.
O senhor Goriot era um ancião de 69 anos. Fora comerciante de massas e enriquecera durante a Revolução. Em 1813, abandonou os negócios e foi morar na Casa Vauquer - Pensão Burguesa para os dois sexos e outros. Inicialmente bem aquinhoado atraiu o interesse da senhora Vauquer, que achava-se ainda interessante para atrair um marido. Mas logo sua roupa fina, suas pratas, seus pertences caros começaram a desaparecer. Ele foi então rebaixado na pensão, em todos os sentidos, e passou a ser chamado o Pai Goriot. Uma das teorias que circulava a respeito do velho era a de que gastava seu dinheiro sustentando mulheres jovens, já que damas muito bem vestidas foram vistas algumas vezes em seus aposentos. Era verdade: ele mantinha mulheres muito jovens - eram suas filhas Anastácia e Delfina. Goriot investiu toda a sua fortuna nas filhas, pelas quais tinha uma paixão quase carnal. Providenciou bons dotes para que casassem com homens ricos: Anastácia casou-se com o Conde de Restaud, e Delfina, com o barão de Nuncigen.
Eugênio de Rastignac era um jovem do interior de uma família nobre empobrecida que foi a Paris estudar direito. Queria desesperadamente ingressar na alta sociedade. Para isso, obteve a proteção da senhora de Beauséant, sua prima. Esta descobriu que seu amante, o senhor d´Ajuda Pinto, por quem deixara o marido, estava de casamento marcado com a senhorita de Rochefilde.
Vautrin era o falso nome de Jacques Collin, condenado às galés que escapara e trabalhava como uma espécie de banqueiro dos condenados. Vautrin empenhou-se em “arranjar” as coisas para que a jovem Victorina Taillefer, moradora da pensão que fora renegada pelo pai, fosse reconsiderada tornando-se uma herdeira rica. Vautrin percebeu que Victorina estava apaixonada por Eugênio e incentivou o estudante a investir na moça para enriquecer. O irmão de Victorina foi então morto em um duelo e a jovem tornou-se única herdeira do pai, muito abastado.
Anástacia de Restaud era amante do dandy e jogador Máximo de Trailles. Além de pegar jóias da família para pagar dívidas de jogo de Máximo - episódio narrado em Gobseck - Anastácia recorria ao Pai Goriot.
A senhora de Beausénant, antes de ir se enterrar na província, para esquecer a traição de d´Ajuda Pinto, apresentou Eugênio a Delfina de Nuncigen. Eles se tornaram amantes e o Pai Goriot emprestou dinheiro para que a filha alugasse e mobiliasse um apartamento para o rapaz.
Vautrin foi preso na pensão Vauquer, tendo sido denunciado pela solteirona Michonneau.
Goriot adoeceu seriamente e nenhuma das duas filhas foi sequer vê-lo. Morreu na miséria e foi cuidado e enterrado por Rastignanc e pelo estudante de medicina Horácio Bianchon.
Em poucos dias, a pensão Vauquer se esvaziou completamente. Vautrin foi preso; Poiret e a senhorita Michonneau foram expulsos, depois de denunciar o fugitivo; Victorina e a mãe partiram para uma vida mais folgada; Rastignac foi morar no apartamento pago por Delfina; e Goriot faleceu.
No primeiro parágrafo de O Pai Goriot, Balzac escreve que “é tudo verdade”. De fato, anotações de Balzac fazem supor que ele ouviu alguma história de filhas que depois de ganhar de tudo, abandonaram o pai. Há outras narrativas no mesmo sentido, mas a referência natural é Rei Lear, sendo que Goriot não possuía uma Cordélia para consolá-lo. O crítico Bellessort, citado por Paulo Rónai, comentou que Goriot não inspira a mesma piedade que Lear, uma vez que não respeita o pai em si mesmo sendo cúmplice do adultério de Delfina.
Vautrin teve também um modelo real, um galeriano chamado Vidcoq que publicou suas memórias em 1828. Vautrin é um Mefistófoles cínico e pragmático, capaz de operar nas sombras e atuar como um deus corrigindo as desigualdades e realizando desejos. Ele lê Rastignac com perfeição, percebe que bastará pouco para que o estudante abandone os escrúpulos e apanhe com as duas mãos o que quer. Balzac insinua uma atração homossexual de Vautrin por Rastignac, algo extremamente sutil e velado, mas que muito humaniza essa notável figura.
Por fim, o puro Eugênio que se angustia em ter que sujar de lama seu único par de botas. O Pai Goriot é o romance de formação de Eugênio de Rastignac. Ele chegou a Paris decidido a estudar e vencer na vida. Mas percebeu que os vencedores não frequentam a cátedra, mas os salões elegantes. Para tanto precisa de uma amante rica e bem relacionada. Ao mesmo tempo, observa os destinos de Goriot, de Victorina, da senhora de Beauséant. “Em Rastignac há muitos traços de Balzac, de muito daquilo que Balzac desejava ser. As lutas de Rastignac com a pobreza e suas transigências com a consciência constituem um quadro da mocidade do próprio escritor. Não fosse sua identificação com Rastignac, e não poderíamos compreender essa insistência - quase irritante - com que pretende dá-lo como puro, quando o sabemos mantido pela amante e cúmplice taciturno de um assassínio”. O dilema de Eugênio é escolher um lado. Quando, após o enterro de Goriot, Rastignac contempla Paris do alto da colina do Père-Lachaise e diz a sua frase: “A nous deux maintenant!”, sabemos o que ele escolheu.