Volume II: Estudos de Costumes – Cenas da Vida Privada (lido entre 5 e 27 de outubro de 2009)
Um Estreia na Vida (fevereiro de 1842)
Personagens: Pierrotin, sr. Moreau (intendente de Presles), sra. Moreau (Estela), conde de Sérisy, Léger (granjeiro), sr. Clapard, sra. Clapard, Oscar Clapard (Husson), Jorge Marset (ajudante do sra. Crottat - notário), José Bridau (falso Shinner), Mistigris (Leão de Lora), sr. e sra Raybert (novos intendentes), Grindot (arquiteto), Jacques Moreau (filho de Moreau), sr. Cardot (tio de Oscar), Camusot (genro de Cardot), sr. Desroches (advogado), Godeschal (aprendiz de Desroches), Marieta (irmã de Godeschal), F. Marset (irmão de Jorge).
A história se passa entre 1822 até “bem depois de 1835”.
Uma Estreia na Vida é uma pequena obra prima. Pequena porque curta. Obra prima, pois nela Balzac empregou toda a sua habilidade. Aqui ele é, como se denominava, um “historiador de costumes”, narrando, em 1842, para a posteridade a França das diligências que morrera com a chegada da estrada de ferro. E é também o hábil contador de histórias, quando extrai de um episódio cômico, que poderia se esgotar em si mesmo, toda a história de uma vida.
Em 1822, o conde de Sérisy, desconfiado de que seu intendente, Moreau, estava lhe roubando, apanhou, incógnito, o coucou de Pierrotin em Paris rumo a Presles. No carro, estavam os pintores José Bridau, que se fazia passar pelo famoso e já nosso conhecido Schinner; seu ajudante, Mistigris (que fazia trocadilhos o tempo inteiro); Jorge Marset, simples aprendiz de notário que se fazia passar por nobre militar cheio de honrarias; e nosso herói, Oscar Husson. Oscar, protegido de Moreau, sentindo-se inferiorizado pela aparente grandeza de seus companheiros de viagem, passou a revelar segredos do conde que conhecia pelas indiscrições de Moreau, que era amante de sua mãe, a senhora Clapard. As fofocas diziam respeito à relação do conde com a sua esposa. O nobre, furioso, despediu Moreau, e Oscar perdeu seu protetor. A senhora Clapard pediu, então, ajuda ao tio Cardot, ancião que aparentava austeridade, mas que, na verdade, era um pândego e amante de dançarinas. Cardot obteve posição para Oscar no escritório de Desroches e passou a custear-lhe a faculdade de Direito. Sob a proteção do sério Godeschal, tudo ia bem para o jovem Oscar. Até que ingressou no escritório o irmão de Jorge Marset, e Oscar o reencontrou. Depois de uma comemoração, Oscar perdeu dinheiro do patrão no jogo e, embriagado, adormeceu, deixando de cumprir um compromisso do escritório. Desroches não perdoou e Oscar foi despedido. Restou a ele o serviço militar. Moreau melhorou a situação de seu protegido, conseguindo que ele ficasse sob às ordens do filho do conde de Sérisy. Em uma batalha na África, Oscar salvou a vida do jovem de Sérisy e perdeu um braço.
Anos depois, os mesmos personagens se encontraram em um carro rumo a Presles. José Bridau, já pintor famoso; Pierrotin, empresário rico; Léger, também rico; Jorge Marset, decadente; e Oscar, um circunspecto burguês que acabou casando com a senhorita Pierrotin. Descobrimos também que o senhor de Canalis, pretendente de Modesta Mignon, desposou a filha de Moreau.
O que faz de Uma Estreia na Vida uma história tão deliciosa? Muitas coisas, mas julgo que a principal é o toque de vida real dos persongens. Oscar é um herói que, a princípio, não provoca nenhuma empatia. A gafe que compromete seu futuro é fruto de sua vaidade e mediocridade. Tempos depois, cai na armadilha de Jorge e, novamente, desperdiça uma oportunidade. O que se espera, a partir daí, é a decadência. Contudo, ele se torna um ótimo militar, com caráter suficiente para arriscar a vida e salvar o filho do homem que o prejudicou. E assim são as pessoas reais, capazes do tolo e do sublime, capazes de cometerem erros e de os corrigirem. No princípio, estranhamos um herói tão infantil e antipático. Contudo, eis nós leitores, algumas páginas depois, lamentando as suas desventuras e torcendo por ele.
Os outros personagens também são deliciosamente reais. Moreau, que rouba descaradamente o patrão, não mede esforços para ajudar o filho da amante. A senhora Clapard cega, como todas as mães, à nulidade do filho. Desroches, justo e reto advogado, que acaba sendo injusto com o jovem herói. O tio Cardot, que salva Oscar por amor à sua dançarina. Como diz Rónai, “em cada um deles encontraremos essa incoerência orgânica que é a prova mais inequívoca da vida real”.
Em Uma Estreia na Vida Balzac utilizou uma experiência pessoal que irá aparecer em outros romances: sua vivência forense. A partir de novembro de 1816, Balzac passou a frequentar aulas de direito na Sorbonne. Porém, naquela época, não era na faculdade que se aprendia ciência jurídica, mas na posição de aprendiz em um escritório de advocacia ou tabelionato. Entre 1816 e abril de 1818, ele trabalhou no escritório de Guillonet-Merville, que ele viria a homenagear com o personagem Derville. Entre 1818 e meados de 1819, Balzac trabalhou para o tabelião Victor Passez. É esse o ambiente que ele descreve no escritório de Desroches. A vida de um aprendiz forense era muito diferente da dos estagiários de hoje em dia. Era uma vida monástica. Eles moravam no emprego, onde também se alimentavam e eram vigiados pelo patrão. Havia uma rígida hierarquia - primeiro, segundo, terceiro ajudante, primeiro, segundo, terceiro escriturário - e ascender nela era uma questão de mérito. Também há relatos das pilhérias e brincadeiras, como os jantares consignados em ata, em um dos quais nosso herói se perdeu. Aqui, mais um oportunidade para conhecer Balzac “historiador de costumes”.
Um Estreia na Vida (fevereiro de 1842)
Personagens: Pierrotin, sr. Moreau (intendente de Presles), sra. Moreau (Estela), conde de Sérisy, Léger (granjeiro), sr. Clapard, sra. Clapard, Oscar Clapard (Husson), Jorge Marset (ajudante do sra. Crottat - notário), José Bridau (falso Shinner), Mistigris (Leão de Lora), sr. e sra Raybert (novos intendentes), Grindot (arquiteto), Jacques Moreau (filho de Moreau), sr. Cardot (tio de Oscar), Camusot (genro de Cardot), sr. Desroches (advogado), Godeschal (aprendiz de Desroches), Marieta (irmã de Godeschal), F. Marset (irmão de Jorge).
A história se passa entre 1822 até “bem depois de 1835”.
Uma Estreia na Vida é uma pequena obra prima. Pequena porque curta. Obra prima, pois nela Balzac empregou toda a sua habilidade. Aqui ele é, como se denominava, um “historiador de costumes”, narrando, em 1842, para a posteridade a França das diligências que morrera com a chegada da estrada de ferro. E é também o hábil contador de histórias, quando extrai de um episódio cômico, que poderia se esgotar em si mesmo, toda a história de uma vida.
Em 1822, o conde de Sérisy, desconfiado de que seu intendente, Moreau, estava lhe roubando, apanhou, incógnito, o coucou de Pierrotin em Paris rumo a Presles. No carro, estavam os pintores José Bridau, que se fazia passar pelo famoso e já nosso conhecido Schinner; seu ajudante, Mistigris (que fazia trocadilhos o tempo inteiro); Jorge Marset, simples aprendiz de notário que se fazia passar por nobre militar cheio de honrarias; e nosso herói, Oscar Husson. Oscar, protegido de Moreau, sentindo-se inferiorizado pela aparente grandeza de seus companheiros de viagem, passou a revelar segredos do conde que conhecia pelas indiscrições de Moreau, que era amante de sua mãe, a senhora Clapard. As fofocas diziam respeito à relação do conde com a sua esposa. O nobre, furioso, despediu Moreau, e Oscar perdeu seu protetor. A senhora Clapard pediu, então, ajuda ao tio Cardot, ancião que aparentava austeridade, mas que, na verdade, era um pândego e amante de dançarinas. Cardot obteve posição para Oscar no escritório de Desroches e passou a custear-lhe a faculdade de Direito. Sob a proteção do sério Godeschal, tudo ia bem para o jovem Oscar. Até que ingressou no escritório o irmão de Jorge Marset, e Oscar o reencontrou. Depois de uma comemoração, Oscar perdeu dinheiro do patrão no jogo e, embriagado, adormeceu, deixando de cumprir um compromisso do escritório. Desroches não perdoou e Oscar foi despedido. Restou a ele o serviço militar. Moreau melhorou a situação de seu protegido, conseguindo que ele ficasse sob às ordens do filho do conde de Sérisy. Em uma batalha na África, Oscar salvou a vida do jovem de Sérisy e perdeu um braço.
Anos depois, os mesmos personagens se encontraram em um carro rumo a Presles. José Bridau, já pintor famoso; Pierrotin, empresário rico; Léger, também rico; Jorge Marset, decadente; e Oscar, um circunspecto burguês que acabou casando com a senhorita Pierrotin. Descobrimos também que o senhor de Canalis, pretendente de Modesta Mignon, desposou a filha de Moreau.
O que faz de Uma Estreia na Vida uma história tão deliciosa? Muitas coisas, mas julgo que a principal é o toque de vida real dos persongens. Oscar é um herói que, a princípio, não provoca nenhuma empatia. A gafe que compromete seu futuro é fruto de sua vaidade e mediocridade. Tempos depois, cai na armadilha de Jorge e, novamente, desperdiça uma oportunidade. O que se espera, a partir daí, é a decadência. Contudo, ele se torna um ótimo militar, com caráter suficiente para arriscar a vida e salvar o filho do homem que o prejudicou. E assim são as pessoas reais, capazes do tolo e do sublime, capazes de cometerem erros e de os corrigirem. No princípio, estranhamos um herói tão infantil e antipático. Contudo, eis nós leitores, algumas páginas depois, lamentando as suas desventuras e torcendo por ele.
Os outros personagens também são deliciosamente reais. Moreau, que rouba descaradamente o patrão, não mede esforços para ajudar o filho da amante. A senhora Clapard cega, como todas as mães, à nulidade do filho. Desroches, justo e reto advogado, que acaba sendo injusto com o jovem herói. O tio Cardot, que salva Oscar por amor à sua dançarina. Como diz Rónai, “em cada um deles encontraremos essa incoerência orgânica que é a prova mais inequívoca da vida real”.
Em Uma Estreia na Vida Balzac utilizou uma experiência pessoal que irá aparecer em outros romances: sua vivência forense. A partir de novembro de 1816, Balzac passou a frequentar aulas de direito na Sorbonne. Porém, naquela época, não era na faculdade que se aprendia ciência jurídica, mas na posição de aprendiz em um escritório de advocacia ou tabelionato. Entre 1816 e abril de 1818, ele trabalhou no escritório de Guillonet-Merville, que ele viria a homenagear com o personagem Derville. Entre 1818 e meados de 1819, Balzac trabalhou para o tabelião Victor Passez. É esse o ambiente que ele descreve no escritório de Desroches. A vida de um aprendiz forense era muito diferente da dos estagiários de hoje em dia. Era uma vida monástica. Eles moravam no emprego, onde também se alimentavam e eram vigiados pelo patrão. Havia uma rígida hierarquia - primeiro, segundo, terceiro ajudante, primeiro, segundo, terceiro escriturário - e ascender nela era uma questão de mérito. Também há relatos das pilhérias e brincadeiras, como os jantares consignados em ata, em um dos quais nosso herói se perdeu. Aqui, mais um oportunidade para conhecer Balzac “historiador de costumes”.
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