
Crime e Castigo conta a história de um jovem estudante de direito de 23 anos de São Petesburgo, Rodion Románovitch Raskólnikov que comete um crime. Raskólnikov vive sustentado pelas mãe, Pulkhéria Raskólnikova, que recebe uma miserável pensão, e pela irmã, Avdótia (Dúnia), governanta em uma casa burguesa na província. Mesmo assim, a pobreza o obriga a abandonar a faculdade. Movido pela falta de recursos - mora em um local insalubre, pouco se alimenta -, pela doença e por algumas teorias por ele elaboradas, o rapaz planeja e executa o assassinato de uma velha usurária, Aliena Ivánova. Durante a execução, com um machado, chega ao apartamento da velha sua irmã, Lisavieta Ivanova, e Raskólnikov é obrigado também a assassiná-la.
Nesse meio tempo, ele recebe uma carta da mãe narrando o noivado de Dúnia com o capitalista Piotr Pietrovich Lúdjin e a viagem próxima de ambas, mãe e irmã, a São Petersburgo para o casamento. Raskólnikov desaprova o plano, pois percebe que a irmã aceitou o pedido para ajudá-lo. E através das palavras da mãe, o jovem advinha que noivo é um homem que deseja uma noiva pobre e submissa que o reverencie.
Raskólnikov tem ao seu lado, desde o princípio, o colega da faculdade Dmitri Prokófich Razumíkhin. Jovem honesto, um pouco ingênuo e infenso à rispidez do protagonista, ele logo se apaixona por Dúnia. Outro personagem importante é Semion Zakháritch Marmieladov Ele conhece Raskólnikov em uma taberna e ele narra sua triste vida. É funcionário público, mas abandonou o trabalho pelo vício na bebida. Sua mulher, Catierina Ivánova, moça de família nobre que empobreceu, está com tuberculose e não tem meios de sustentar os três filhos pequenos do casal, Polienka, Kólia e Lênia (9, 7 e 6 anos). A filha mais velha de Marmieladov, Sônia Semionova Marmeliadova, ajuda os pais e madrasta se prostituindo. Ao longo da narrativa, Marmieladov morre atropelado por cavalos. Raskólnikov dá a Catierina todo o dinheiro que recebeu da mãe para o enterro do alcoolista. E no dia do enterro, Catierina morre. O casal Marmieladov-Catierina foi inspirado na primeira esposa de Dostoiévski, Maria Dmitrieva e seu primeiro marido, Issáiev.
Na galeria de personagens principais (há muitos, mais de 80), há ainda Arkadi Ivánovitch Svidrigáilov e Porfiri Pietróvitch.
Svidrigáilov aparece pela primeira vez na longa carta de Pulkhéria para Raskólnikov. Ele era o patrão da casa onde Dúnia trabalhava. Foi literalmente comprado pela mulher, uma solteirona endinheirada, Marfa Pietróvna, e com ela fez um acordo: viveria com ela na província e não teria casos amorosos sérios. Marfa tolerava, no máximo, casos com criadas de quarto. Svidrigáilov se apaixonou por Dúnia e provocou uma incidente que levou à difamação da moça. O mal entendido foi desfeito e Dúnia reabilitada, momento em Lúdjin apareceu para resgatá-la. Svidrigáilov é pedófilo, o que é retratado com realismo pelo autor. Ele vai para a cidade após a morte de Marfa, que, não fica claro, poderia ter sido provocada por ele. Apesar do mau caráter, Svidrigáilov pratica uma série de boas ações. Entre elas, paga o enterro de Catierina e providencia para que os órfãos fiquem em um bom internato. Também dá dinheiro à Sonia e à família de uma menina de 16 anos com quem ele iria se casar (na verdade iria comprá-la dos pais). Tem-se a impressão de que desde que foi para São Petersburgo ele estava pensando em se suicidar, o que, finalmente, ele faz com um tiro na cabeça.
Porfiri Pietróvitch é o juiz de instrução que, através do estudo das atitudes de Raskólnikov, descobre que ele cometeu o crime. Faz um jogo psicológico com o protagonista e o incentiva a se entregar, já que teria uma série de atenuantes: sua doença, o fato de não ter usado o dinheiro que roubou da velha e a porta aberta quando cometia o crime. Raskólnikov acaba se entregando, mas não a Porfiri, a Ilia Pórokh.
No final, Raskólnikov é condenado a sete anos na Sibéria. Vai para lá acompanhado por Sônia. Pulkhéria falece. Dúnia, que rompera o noivado com Lúdjin, casa com Razumíkhin .
A última cena da narrativa ocorre um ano e meio depois do crime (o crime ocorreu em julho de 1865), quando Raskólnikov reconhece seu amor por Sônia e encontra nesse amor a redenção que até então não encontrara.
Muita tinta já foi gasta para falar desse livro sob os mais diversos aspectos: jurídicos, psicológicos, históricos, filosóficos.
Um dos ponto mais debatidos é o motivo do crime. O protagonista apresenta vários motivos, mas o mais plausível se relaciona a uma teoria segundo a qual existem homens ordinários, a maioria, e homens extraordinários, como Napoleão ou César, que são capazes de ultrapassar os limites para conquistar o que desejam. Esses últimos poderiam fazer o que quisessem e apenas colheriam a glória. Raskólnikov diz:
"A velha vai ver que foi mesmo um erro, mas não é nela que está a questão! A velha foi apenas um doença...eu queria ultrapassar o limite o quanto antes...eu não matei uma pessoa, eu matei um princípio! Foi o princípio que eu matei, mas além eu não fui, permaneci do lado de cá... O único que eu soube fazer foi matar. Demais, nem isso eu soube, como se está verificando."
Assim, o erro de Raskólnikov segundo ele mesmo não foi ter matado, mas não ter conseguido seguir com a vida após o crime, utilizar o produto do roubo para voltar para a universidade e fazer grandes coisas, como um grande homem teria feito no seu lugar.
Ele não se arrepende do crime nem no final. O que traz a paz a Raskólnikov na última cena, não é o arrependimento, mas a redenção pelo amor de Sônia e pela perspectiva de uma vida com ela.
Eis a sombra de Napoleão Bonaparte sobre os jovens do século XIX. Eugênio de Rastignhac, Luciano de Rubempré, Julien Sorel, Rodion Raskólnikov, todos atingidos, de forma diversa, pela perspectiva de atingir a grandeza.
Raskólnikov é um dos personagens mais desagradáveis da literatura de todos os tempos. O leitor não desenvolve nenhuma empatia com ele, coisa que o mau caráter Arkadi Ivánovitch Svidrigáilov, com todos os seus defeitos: jogador, agressor de mulheres, pedófilo, consegue logo que aparece no quarto do protagonista. Rodion desenvolve um certo fascínio, que é o que explica, por exemplo, amizade de Razumíkhin e o desvelo da empregada Nastácia. Mas Razumíkhin bem o define: "Ele não gosta de ninguém, talvez nunca venha a gostar". É o gênio de Dostoiévski que nos faz acompanhar essa criatura insuportável com o maior dos interesses por quase seiscentas páginas.
É um ótimo livro, mas faz tempo que o li. Talvez esteja na hora de, também, fazer uma segunda leitura.
ResponderExcluirA tradução direto do russo faz toda a diferença Marques-Rodrigues.
ExcluirBacana o comentário
ResponderExcluirEstou lendo agora. Estou na página 360 de 600. Quero ver logo o desfecho dessa proeminente obra!
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