sexta-feira, 15 de julho de 2011

Todos os fogos o fogo

Todos os fogos o fogo. Julio Cortazar. Rio de Janeiro: Ed. Civilização Brasileira, 2007. Tradução: Gloria Rodrigues.

Lido entre 1 e 8 de junho de 2011.

Todos os fogos o fogo de Júlio Cortazar é livro texto de oficina literária. São oito contos modelares para que não esqueçamos como pode ser sublime uma narrativa curta.
Um meus preferidos, A auto-estrada do sul, transforma um engarrafamento em uma situação meio onírica, meio estado de natureza. Não sei se José Saramago pensou nesse conto ao escrever Ensaio sobre a Cegueira, mas me parece claro que existe identidade entre as duas obras.
A saúde dos doentes parte de uma situação corriqueira, a morte de um filho em um acidente e a impossibilidade de dar a notícia à mãe doente, para criar um jogo de fantasia e realidade.
Reunião, com epígrafe de Che Guevara, é totalmente realista. O narrador (Che) relata a subida de uma serra com um grupo de guerrilheiros, fugindo das forças oficiais.
Senhorita Cora, o meu preferido, é escrito do início ao fim em fluxo de consciência. Um adolescente, Pablo, está no hospital para fazer uma operação de apendicite. Seus pais o visitam e ele é atendido por uma bela e jovem enfermeira, a senhorita Cora. As vozes de Pablo, de Cora, da mãe, do pai, dos médicos, se alternam sem se confundir. Talvez esse conto seja autobiográfico, já que Cortazar foi uma criança doente e passou temporadas hospitalizado.
A ilha ao meio-dia conta a obsessão de um comissário de bordo por uma faixa de terra da Grécia que ele avista do avião, da rota que ele faz, pontualmente ao meio dia. Confesso que não gostei do desfecho.
Instruções a John Howell brinca com uma ideia que todos que já foram ao teatro tiveram: o assistente que é convidado a atuar na peça.
Todos os fogos o fogo, conto que dá título ao livro, alterna duas narrativas: um grupo em uma arena romana assiste a uma luta de gladiadores e um casal de namorados/amantes está em crise, pois uma traição foi descoberta. É incrível como o escritor faz esse esquema funcionar.
O outro céu é uma narrativa fantástica na qual o narrador circula ao mesmo tempo por Paris e Buenos Aires. Na capital portenha, mora com a mãe, tem uma noiva e trabalha na Bolsa, ao passo que em Paris, circula à noite pelas galerias, “esse mundo que escolheu um céu mais próximo”, namora a prostituta Josiane e conversa com os notívagos sobre os crimes do assassino Laurent. Assisti  ontem ao Meia Noite em Paris de Woody Allen. Há uma cena em que Gil (Owen Wilson) conversa com pintores da Paris da década de 1920 e explica que ele vive em duas dimensões: em uma está noivo e vai casar; em outra está envolvido com a amante de Pablo Picasso. Lembrei imediatamente desse conto.
Histórias assim, não há que comentar. Há que ler.

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