Personagens:
Grandet, Senhora Grandet (née Bertellière); Eugênia; C. de Boufons
(sobrinho do senhor Cruchot); senhor Cruchot (notário); Padre Cruchot; senhor de
Grassins; senhora de Grassins; Adolfo de Grassins; Nanon (senhora Cornoiller
depois de casar); Carlos Grandet; Anete (amante de Carlos); senhorita
d'Aubrion (noiva de Carlos).
A história começa em 1819 e termina por volta de 1829.
Paulo Rónai nos conta que Eugênia Grandet foi o primeiro sucesso de público e crítica de Balzac. Foi escrito em um período especial: entre o primeiro encontro com Eveline Hanska em Lausanne, quando se conheceram pessoalmente, e o segundo, em Genebra, quando se tornaram amantes. Foi, portanto, um apaixonado Balzac que escreveu a história do amor fiel e exaltado da provinciana Eugênia Grandet.
A fórmula do início é tipicamente balzaquiana e nossa conhecida: um retrato da família Grandet na cidade de Samur. A descrição da sala da casa Grandet nos conta quase tudo sobre a família que a habita. E aí aparece o personagem que ofusca a heroína: o tanoeiro Grandet. Ele passava os dias fazendo negócios lucrativos e as noites encerrado no quarto contando seus milhões. E apesar das vultosas quantias entesouradas, submetia esposa e filha a uma vida no limite da sobrevivência: “Durante quinze anos, todos os dias da mãe e da filha haviam decorrido placidamente naquele lugar, em constante trabalho, desde abril até novembro. No dia 1º deste último mês elas se transferiam para junto da lareira, a fim de passar o inverno. Somente nesse dia Grandet permitia que se acendesse o fogo na sala. E o fazia apagar a 31 de março, indiferente ao frio dos primeiros dias da primavera e do outono”.
A austera casa Grandet era frequentada por dois grupos: os Cruchots e os Grassins. O sobrinho do senhor Cruchot, presidente do tribunal de primeira instância de Samur, o o jovem Adolfo de Grassins aspiravam à mão da rica Eugênia. Grandet, que não pretendia dar a filha a nenhum dos dois, jogava com esses interesses para obter favores e aumentar sua fortuna.
O equilíbrio foi rompido pela chegada de Paris do sobrinho de Grandet, o belo Carlos. O rapaz, um típico dândi parisiense, vestido na última moda e já dotado de uma amante casada, chegou a Samur, enviado pelo pai, irmão do velho avarento. Carlos trouxe uma carta fechada na qual o pai contava a Grandet a sua falência, a desgraça de seu nome na praça em Paris e anunciava o seu suicídio. Pedia a Grandet que ajudasse o sobrinho. Grandet conseguiu, utilizando os serviços de des Grassins, suspender a falência do irmão. E preparou a viagem de Carlos para as Índias. Nesse meio tempo, o romance. Eugênia e Carlos se apaixonaram: juraram amor eterno e a moça emprestou ao amado grande quantia de dinheiro que guardava. Carlos partiu. Grandet, ao descobrir o sumiço do tesouro da filha, ficou fora de si. Trancou-a no quarto a pão e água. O desentendimento entre pai e filha agravou a enfermidade da senhora Grandet, que veio a falecer. No final de 1827, aos oitenta e três anos, foi a vez do velho Grandet. Antes, iniciou Eugênia nos mistérios da enorme fortuna. Eugênia, já nas casa dos trinta, esperava por Carlos. Seus pretendentes continuavam a frequentar a casa, mas cada vez mais desanimados. Em 1828, Carlos retornou. Refizera a sua fortuna, mas esquecera a prima. Logo arranjou um casamento de conveniência com a senhorita d’ Aubrion, uma jovem sem fortuna e atrativos, mas com pais bem relacionados e com a partícula. Ao ser interpelado por des Grassins para pagar as dívidas do pai e reabilitar seu nome, recusou-se a fazer dizendo que adotaria o nome do sogro. Eugênia, ao saber de tudo, fez um acordo com o juiz Cruchot: se casaria com ele, mas seria um casamento de fachada. Em troca ele deveria procurar o primo, devolver seus pertences e quitar a dívida do tio. Carlos descobriu tarde demais o quão rica era a prima. E Cruchot, que utilizou seus conhecimentos jurídicos para fazer um acordo matrimonial desvantajoso para Eugênia, foi apanhado pela fortuna: faleceu pouco tempo depois do matrimônio. Eugênia, ao final, estava sozinha.
Entende-se o sucesso de Eugênia Grandet. Mesmo sem o toque de gênio de Pai Goriot, o romance tem tudo o que Balzac sabe de melhor fazer. Em primeiro lugar, os personagens. Grandet é um dos grandes avarentos da literatura. Balzac conseguiu criar um avarento humano, bem menos caricatural que Gobsek. Ele distribuía pela manhã os víveres para o dia, obrigando a criada, a mulher e a filha a contrabandear comida. Mas seu amor pela filha e sua devoção pela esposa eram reais e o faziam, muitas vezes, fraquejar.
Eugênia é mais uma versão da virgem francesa de Balzac, a jovem que passa a viver quando descobre o amor. Surpreende, contudo, ao casar com Cruchot e humilhar o primo, pagando suas dívidas. E é encantador ver como ela trazia o velho Grandet dentro de si. Depois da morte do pai, ela manteve os mesmos hábitos avarentos. Ela só não era considerada avara na comunidade por seus trabalhos e doações para caridade.
A criada Nanon é uma forte personagem de apoio. Humilde e orgulhosa, comparsa e opositora das rabugices de Grandet. Acabou casada, como uma boa burguesa, após a morte do patrão. São muitos exemplos da incoerência orgânica que é a prova inequívoca da vida real.
Um segundo ponto, são as intrigas que Balzac consegue articular tão bem, sobretudo na província. As visitas do cruchonistas e grassinistas à casa Grandet atrás do ouro de Eugênia garantem os momentos cômicos do romance. Só que aqui as tramoias não roubam a cena, como em Úrsula Mirouët. Elas fazem um bom pano de fundo para ação que começa com a chegada de Carlos.
Finalmente, o amor segundo Balzac. O amor de Eugênia é totalmente idealizado. Ela se apaixonou pelo primo, à primeira vista, e devotou sua vida a esperá-lo praticamente sem conhecê-lo. O Carlos que aparece em 1828, é bem diferente do rapaz que chorou por dias a morte do pai. Em duas deliciosas páginas que Rónai denomina de “educação sentimental” de Carlos, surge um homem frio, calculista, envolvido em negócios nada morais, como tráfico de escravos. Ele era, afinal, um Grandet. A solução de Balzac poderia ter sido um casamento infeliz com Carlos, como o de Augustina Guillaume. Um final feliz com Carlos, como o de Adelaide, em A Bolsa. Um casamento feliz com Cruchot, como o de Modesta Mignon (que se apaixonou por Canalis, mas escolheu la Brière). Balzac escolheu um fim pragmático. Um casamento de fachada com Cruchot, para contentar a comunidade, e a viuvez precoce. Balzac apaixonado parecia pensar que se ama somente uma vez na vida. Mas no final, ele diz que Eugênia ainda poderia vir a se casar.
A história começa em 1819 e termina por volta de 1829.
Paulo Rónai nos conta que Eugênia Grandet foi o primeiro sucesso de público e crítica de Balzac. Foi escrito em um período especial: entre o primeiro encontro com Eveline Hanska em Lausanne, quando se conheceram pessoalmente, e o segundo, em Genebra, quando se tornaram amantes. Foi, portanto, um apaixonado Balzac que escreveu a história do amor fiel e exaltado da provinciana Eugênia Grandet.
A fórmula do início é tipicamente balzaquiana e nossa conhecida: um retrato da família Grandet na cidade de Samur. A descrição da sala da casa Grandet nos conta quase tudo sobre a família que a habita. E aí aparece o personagem que ofusca a heroína: o tanoeiro Grandet. Ele passava os dias fazendo negócios lucrativos e as noites encerrado no quarto contando seus milhões. E apesar das vultosas quantias entesouradas, submetia esposa e filha a uma vida no limite da sobrevivência: “Durante quinze anos, todos os dias da mãe e da filha haviam decorrido placidamente naquele lugar, em constante trabalho, desde abril até novembro. No dia 1º deste último mês elas se transferiam para junto da lareira, a fim de passar o inverno. Somente nesse dia Grandet permitia que se acendesse o fogo na sala. E o fazia apagar a 31 de março, indiferente ao frio dos primeiros dias da primavera e do outono”.
A austera casa Grandet era frequentada por dois grupos: os Cruchots e os Grassins. O sobrinho do senhor Cruchot, presidente do tribunal de primeira instância de Samur, o o jovem Adolfo de Grassins aspiravam à mão da rica Eugênia. Grandet, que não pretendia dar a filha a nenhum dos dois, jogava com esses interesses para obter favores e aumentar sua fortuna.
O equilíbrio foi rompido pela chegada de Paris do sobrinho de Grandet, o belo Carlos. O rapaz, um típico dândi parisiense, vestido na última moda e já dotado de uma amante casada, chegou a Samur, enviado pelo pai, irmão do velho avarento. Carlos trouxe uma carta fechada na qual o pai contava a Grandet a sua falência, a desgraça de seu nome na praça em Paris e anunciava o seu suicídio. Pedia a Grandet que ajudasse o sobrinho. Grandet conseguiu, utilizando os serviços de des Grassins, suspender a falência do irmão. E preparou a viagem de Carlos para as Índias. Nesse meio tempo, o romance. Eugênia e Carlos se apaixonaram: juraram amor eterno e a moça emprestou ao amado grande quantia de dinheiro que guardava. Carlos partiu. Grandet, ao descobrir o sumiço do tesouro da filha, ficou fora de si. Trancou-a no quarto a pão e água. O desentendimento entre pai e filha agravou a enfermidade da senhora Grandet, que veio a falecer. No final de 1827, aos oitenta e três anos, foi a vez do velho Grandet. Antes, iniciou Eugênia nos mistérios da enorme fortuna. Eugênia, já nas casa dos trinta, esperava por Carlos. Seus pretendentes continuavam a frequentar a casa, mas cada vez mais desanimados. Em 1828, Carlos retornou. Refizera a sua fortuna, mas esquecera a prima. Logo arranjou um casamento de conveniência com a senhorita d’ Aubrion, uma jovem sem fortuna e atrativos, mas com pais bem relacionados e com a partícula. Ao ser interpelado por des Grassins para pagar as dívidas do pai e reabilitar seu nome, recusou-se a fazer dizendo que adotaria o nome do sogro. Eugênia, ao saber de tudo, fez um acordo com o juiz Cruchot: se casaria com ele, mas seria um casamento de fachada. Em troca ele deveria procurar o primo, devolver seus pertences e quitar a dívida do tio. Carlos descobriu tarde demais o quão rica era a prima. E Cruchot, que utilizou seus conhecimentos jurídicos para fazer um acordo matrimonial desvantajoso para Eugênia, foi apanhado pela fortuna: faleceu pouco tempo depois do matrimônio. Eugênia, ao final, estava sozinha.
Entende-se o sucesso de Eugênia Grandet. Mesmo sem o toque de gênio de Pai Goriot, o romance tem tudo o que Balzac sabe de melhor fazer. Em primeiro lugar, os personagens. Grandet é um dos grandes avarentos da literatura. Balzac conseguiu criar um avarento humano, bem menos caricatural que Gobsek. Ele distribuía pela manhã os víveres para o dia, obrigando a criada, a mulher e a filha a contrabandear comida. Mas seu amor pela filha e sua devoção pela esposa eram reais e o faziam, muitas vezes, fraquejar.
Eugênia é mais uma versão da virgem francesa de Balzac, a jovem que passa a viver quando descobre o amor. Surpreende, contudo, ao casar com Cruchot e humilhar o primo, pagando suas dívidas. E é encantador ver como ela trazia o velho Grandet dentro de si. Depois da morte do pai, ela manteve os mesmos hábitos avarentos. Ela só não era considerada avara na comunidade por seus trabalhos e doações para caridade.
A criada Nanon é uma forte personagem de apoio. Humilde e orgulhosa, comparsa e opositora das rabugices de Grandet. Acabou casada, como uma boa burguesa, após a morte do patrão. São muitos exemplos da incoerência orgânica que é a prova inequívoca da vida real.
Um segundo ponto, são as intrigas que Balzac consegue articular tão bem, sobretudo na província. As visitas do cruchonistas e grassinistas à casa Grandet atrás do ouro de Eugênia garantem os momentos cômicos do romance. Só que aqui as tramoias não roubam a cena, como em Úrsula Mirouët. Elas fazem um bom pano de fundo para ação que começa com a chegada de Carlos.
Finalmente, o amor segundo Balzac. O amor de Eugênia é totalmente idealizado. Ela se apaixonou pelo primo, à primeira vista, e devotou sua vida a esperá-lo praticamente sem conhecê-lo. O Carlos que aparece em 1828, é bem diferente do rapaz que chorou por dias a morte do pai. Em duas deliciosas páginas que Rónai denomina de “educação sentimental” de Carlos, surge um homem frio, calculista, envolvido em negócios nada morais, como tráfico de escravos. Ele era, afinal, um Grandet. A solução de Balzac poderia ter sido um casamento infeliz com Carlos, como o de Augustina Guillaume. Um final feliz com Carlos, como o de Adelaide, em A Bolsa. Um casamento feliz com Cruchot, como o de Modesta Mignon (que se apaixonou por Canalis, mas escolheu la Brière). Balzac escolheu um fim pragmático. Um casamento de fachada com Cruchot, para contentar a comunidade, e a viuvez precoce. Balzac apaixonado parecia pensar que se ama somente uma vez na vida. Mas no final, ele diz que Eugênia ainda poderia vir a se casar.
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