quarta-feira, 22 de setembro de 2010

A Revolução de 1989 – A queda do Império Soviético


Lido entre 4 e 21 de setembro de 2010

Existe uma enorme diferença entre estudar episódios históricos dos quais temos lembranças e, dos quais não temos. Explico: Victor Sebestyen, jornalista húngaro que escreveu A Revolução de 1989 – A queda do Império Soviético, situou o seu relato entre 1978 e 1989. Assim, tenho memórias relacionadas aos personagens ou fatos dessa história. Ter a história relacionada a nossa memória pessoal faz muita diferença.

Como quase a totalidade das crianças da minha geração, cresci com medo de uma guerra nuclear. Quando tinha sete ou oito anos e estudava numa escola católica, pedia nas minhas orações antes de dormir que os presidentes dos Estados Unidos e da União Soviética não apertassem o botão. O mundo comunista, ou o pouco que chegava dele para nós, era objeto de medo e fascínio. Lembro das Olimpíadas de Moscou em 1980. Víamos pela televisão as ginastas perfeitas dos países comunistas. Os adultos nos diziam que aqueles jovem vencedores eram separados dos pais ao nascerem e o Estado definia o que eles deveriam fazer. O que poderia ser mais aterrorizante para uma criança do que a perspectiva de ser separada dos pais? Nós morríamos de medo. Lembro do funeral de Leonid Brejnev em 1982. Da beleza sinistra dos soldados marchando em passo de ganso.

Victor Sebestyen faz uma reportagem histórica, ou seja, ele não analisamuito os fatos: narrou em ordem cronológica os acontecimentos mais importantes. E se ate maos países da famosa cortina de ferro: Polônia, Hungria, Tchecoeslováquia, Romênia, Bulgária, Alemanha Oriental e, naturalmente, a União Soviética. Ele sublinhou as diferenças entre o comunismo implantado nos países e como essas diferenças se refletiram na sua queda.

Também há uma ênfase nas biografias. O Papa Joâo Paulo II, Ronald Reagan, Lech Walesa, Mikhail Gorbachev, Nicolai Ceuscescu, Vaclav Havel são protagonistas, com uma queda explícita do autor por Reagan e Gorbachev. Reagan é apresentado como um idealista, um homem cujo maior desejo era acabar com a guerra fria. Sebestyen diz que ele não revelava o que realmente pensava e que tinha ferrenhos embates com seus assessores linha-dura. Chega a dizer que Reagan não revidaria em caso de ataque soviético, o que é muito difícil de acreditar. Gorbachev é apresentado como um inteligente soldado do comunismo que ocultou por muito tempo suas ideias liberalizantes para colocá-las em prática ao chegar ao poder. Não queria, de forma alguma, acabar com o comunismo, mas reformá-lo. Por outro lado, não pretendia manter mais a zona de influência soviética, de modo que nem cogitou intervir em nenhuma das revoluções de 1989. Aparece como uma personalidade cativante, inspirada, mas um pouco inseguro e nada organizado. Selbestyen revelou algo que pode ser adivinhado por aqueles que conhecem o que aconteceu com a União Soviética após 1989: Perstroika e Glasnost eram só palavras, não havia um plano por trás.

O ano de 1989 é narrado praticamente mês a mês. Um dos destaques é para a queda do muro de Berlim em 9 de novembro de 1989 que foi motivada por um erro de Günter Schabowski em uma entrevista coletiva. O funcionário do partido comunista foi anunciar uma lei que permitia a saída dos alemães orientais pelos postos de fronteira. Era uma medida de urgência para solucionar o êxodo de alemães pela Hungria e Techecoeslováquia que vinha ocorrendo. Peguntado por um jornalista americano quando a regra passaria a valer, Schabowski respondeu "imediatamente". Isso gerou a enorme aglomeração nos postos junto ao muro que provocou a sua queda no início da madrugada.

Os eventos na Romênia dão o tom dramático. Lá, praticamente não havia oposição organizada. O ditador Nicolai Ceuscescu era temido e reverenciado, embora odiado pela maioria da população. A revolução foi desencadeada por incidentes na cidade de Timisoara, na Transilvânia. A repressão e os boatos espalhados levaram o ditador a organizar um comício em Bucareste para mostrar que estava no poder e que nada iria mudar. Quando discursava, as vaias começaram e Ceuscescu saiu dali praticamente em fuga. Foi formada uma frente de Salvação Nacional. Em todo país, oficiais da Securitate, polícia secreta do regime, passaram a atacar: foram 1104 mortes em toda a Romênia. A solução foi o julgamento e a condenação a morte de Ceuscescu e de sua esposa, Elena. Em 25 de dezembro de 1989, o casal mais temido do país foi julgado, de forma totalmente irregular, e enfrentou o pelotão de fuzilamento.

Victor Sebestyen não esconde seu profundo ódio ao comunismo. Sua análise das personalidades é um tanto maniqueísta: comunistas maus/anti-comunistas bons. Figuras como Vaclav Havel e Lech Walesa aparecem somente com qualidades. Ele chega a dizer que as acusações de infidelidade conjugal contra Walesa eram fofocas, que ele era fiel a sua esposa Danuta! Como Sebestyen sabe?

Mas o autor consegue, com um relato cronológico, prender a atenção do leitor do início ao fim. É uma leitura obrigatória para quem gosta de história recente ou quer testar sua memória afetiva.

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